Reforma agrária escancara conflito entre governo, produtores e MST no Congresso
Parlamentares cobram respostas e apontam clima de insegurança jurídica no campo diante da escalada de invasões

A tensão entre o governo federal, produtores rurais e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) voltou ao centro do debate político com a realização de uma audiência pública na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (Capadr), na terça-feira (7).
Convocado, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, prestou esclarecimentos sobre a condução da reforma agrária e o papel do MST no atual governo.
O clima foi de confronto. Parlamentares da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) acusaram o governo de omissão diante do aumento das invasões de terra desde o início da gestão Lula.
Segundo o presidente da Comissão, deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS), o número de ocupações em 2023 chegou a 72 — mais do que todo o acumulado entre 2019 e 2022.
“É um retrocesso perigoso. O produtor investe, trabalha, corre risco, e agora precisa lidar com um clima de insegurança jurídica. Fica difícil produzir quando o Estado se omite”, afirmou.
A deputada Carolina de Toni (PL-SC) intensificou as críticas ao acusar o MST de controlar informalmente a seleção de assentados. “Essa é a reforma agrária que o governo defende? Um sistema sem critério, onde a média de renda não chega a um salário mínimo? Isso é indigno”, disse.
Teixeira negou qualquer estímulo oficial às ocupações e afirmou que todas as ações do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) seguem os parâmetros legais e constitucionais.
“As ocupações são protestos, não permanentes. Se houver violação de propriedade, a Justiça deve agir. O governo não compactua com ilegalidades”, garantiu o ministro.
Contestação
Ainda assim, os parlamentares ligados ao agro contestaram. O deputado Evair de Melo (PP-ES) criticou o que chamou de apropriação ideológica dos termos “reforma agrária” e “agricultura familiar” por parte do MST.
“A reforma agrária não tem relação com o MST nem com o PT ou o MDA. A primeira foi feita no Espírito Santo, mas ela foi justa, correta e lícita. E onde tem reforma justa o MST não aparece, bem como não apareceu. A reforma da Constituição não tem movimento criminoso”, afirmou.
O ministro rebateu os ataques e classificou como "criminalização das organizações do campo" as declarações feitas por parlamentares. Ele defendeu a meta de assentar 326 mil famílias até 2026 por meio do programa Terra da Gente e citou a queda nos preços de alimentos como um dos reflexos da ampliação da agricultura familiar.
Os argumentos não convenceram. “Falam de alimento barato como se fosse vitória, mas estão esquecendo que é o produtor quem está pagando essa conta. Isso é miséria disfarçada de política social”, ironizou Evair de Melo.
O deputado Ricardo Salles (Novo-SP), relator da extinta CPI do MST, foi ainda mais direto: “Já distribuímos terra demais para gente incapacitada demais, gastando dinheiro demais. Esse modelo se exauriu”.
Teixeira anunciou ainda a chegada de 742 novos servidores ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), com o objetivo de fortalecer a estrutura do órgão, esvaziada em gestões anteriores.
Condução sob crítica
Para o presidente do Instituto do Agronegócio (IA), Isan Rezende, o problema não está na ideia da reforma agrária, mas em como ela vem sendo conduzida. “Reforma agrária não é palavrão. Mas precisa ser feita com base em critérios técnicos, produtivos e legais. Não pode ser sequestrada por pautas ideológicas ou instrumentos de pressão política”, afirmou.
Rezende destaca um descompasso entre o discurso oficial e a realidade no campo.
“Na prática, vemos aumento das ocupações, insegurança sobre a posse da terra e um esvaziamento das garantias institucionais. O produtor rural, que gera emprego e alimento, se vê numa encruzilhada: ou produz ou se defende”.
Para ele, o debate precisa avançar com transparência e diálogo. “O Brasil tem terras disponíveis e uma necessidade urgente de produção sustentável. O que não dá é tratar o produtor como culpado por possuir terra. Segurança jurídica é o mínimo para manter o campo de pé”.
Rezende também alertou para o risco de politização crescente no meio rural.
“O campo não pode ser palanque. O produtor quer previsibilidade, acesso a crédito, segurança jurídica e políticas públicas que funcionem — não discursos vazios ou ameaças de invasão. A insegurança só afasta investimentos e trava o avanço da agricultura familiar e empresarial”, concluiu.
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