Açúcar cristal: o que esperar do indicador no fim de safra?
O Indicador do cristal branco sinaliza um final de safra com preços pressionados, mas o cenário futuro pode mudar
Com a safra de cana-de-açúcar 2025/26 se aproximando do fim na região Centro-Sul, o produtor olha para o mercado e sente um aperto. Os preços do açúcar cristal, que chegaram a animar o setor no início do ciclo, agora operam em patamares bem mais modestos.
Para se ter uma ideia, o Indicador CEPEA/ESALQ para o açúcar cristal (cor Icumsa 130-180) girava em torno de R$ 141,36 por saca de 50 kg em abril. Agora, os valores negociados no mercado paulista estão na casa dos R$ 106,00. Essa queda acende um alerta e levanta a pergunta que não quer calar: o que está acontecendo e para onde vamos? A resposta não é simples e envolve uma combinação de fatores, desde a oferta imediata no mercado até decisões estratégicas dentro das usinas e o humor do mercado internacional.
O que explica a pressão atual nos preços do açúcar?
A explicação mais direta para a queda nos preços é a boa e velha lei da oferta e da procura. Com o avanço da colheita, uma grande quantidade de açúcar foi produzida e chegou ao mercado. Essa disponibilidade elevada no mercado à vista, ou seja, para pronta entrega, cria um ambiente de maior competição entre os vendedores. Quando há muito produto disponível, os compradores têm mais poder de barganha, o que naturalmente pressiona os preços para baixo. É um cenário comum em períodos de safra, mas que este ano parece mais acentuado.
As usinas e cooperativas precisam fazer caixa para honrar seus compromissos, e isso muitas vezes significa vender a produção mesmo em um momento de cotações mais baixas. Essa movimentação para liquidar estoques aumenta ainda mais o volume de açúcar disponível para negociação imediata, contribuindo para manter o Indicador do cristal branco nos níveis atuais. Basicamente, estamos vivendo o pico da oferta da safra, e o mercado responde a isso com valores menos remuneradores para o produtor.
A balança da usina: cana de menor qualidade pende para o etanol
Aqui a conversa começa a ficar mais estratégica e aponta para o futuro. Um fator crucial que está influenciando as decisões das usinas nesta reta final de safra é a qualidade da matéria-prima. Relatos de campo e análises, indicam uma menor qualidade da cana-de-açúcar que está sendo processada. Em termos práticos, isso significa um menor teor de Açúcares Totais Recuperáveis (ATR). Simplificando, a cana está menos “doce” do que o ideal, seja por questões climáticas ou de manejo.
Diante de uma cana com menor ATR, o gestor da usina faz as contas. Produzir açúcar com essa matéria-prima pode ter um rendimento industrial menor, tornando a operação menos lucrativa. Por outro lado, a produção de etanol pode ser mais vantajosa, pois o processo de fermentação consegue um bom aproveitamento mesmo com um ATR inferior. Essa decisão de redirecionar uma fatia maior da cana para a produção de etanol tem uma consequência direta e importante: diminui a quantidade de açúcar que será produzida daqui para frente, sinalizando uma possível restrição de oferta no futuro.
Como o Indicador do cristal branco pode se comportar?
O mercado de commodities agrícolas é uma constante dança entre o presente e o futuro. Embora o Indicador do cristal branco reflita a realidade atual de preços baixos devido à alta oferta, os agentes de mercado já estão de olho nos sinais de amanhã. A notícia de que mais cana está virando etanol em vez de açúcar funciona como um alerta de que o cenário de fartura pode não durar. Essa expectativa de uma oferta mais enxuta nos próximos meses pode começar a dar sustentação aos preços, limitando quedas mais drásticas e, eventualmente, abrindo caminho para uma recuperação.

Para o produtor, é fundamental acompanhar alguns fatores que vão ditar o ritmo dessa mudança:
O mix de produção das usinas: Monitorar a proporção de cana destinada ao açúcar versus etanol, divulgada por órgãos como a UNICA, é essencial;
Condições climáticas: O clima para o desenvolvimento da próxima safra (2026/27) será decisivo para a qualidade e volume da matéria-prima;
Demanda por etanol: O consumo de etanol hidratado nos postos de combustível influencia diretamente a atratividade de sua produção;
Movimentos do mercado externo: As exportações e os preços internacionais continuarão a ser um vetor importante para o mercado interno.
O cenário internacional e o papel da China
Nenhum produtor brasileiro está isolado do que acontece no mundo. O mercado internacional de açúcar também vive um momento de pressão. Os contratos futuros do açúcar demerara, negociados na Bolsa de Nova York (ICE Futures), estão operando em suas mínimas dos últimos cinco anos. Esse valor serve como uma referência global e impacta diretamente a atratividade das exportações brasileiras. Com preços externos baixos, a tendência é que uma parte maior da produção fique no mercado interno, aumentando a oferta local.
Nesse contexto, grandes compradores globais, como a China, aproveitam o momento favorável para adquirir o produto brasileiro a preços mais competitivos. Embora o volume de exportação seja positivo para o balanço comercial do país, a remuneração mais baixa no mercado internacional ajuda a manter as cotações domésticas pressionadas. Portanto, a recuperação do Indicador do cristal branco também depende de uma melhora no cenário global, algo que ainda não se desenhou de forma clara no horizonte.
A visão dos especialistas sobre o futuro da oferta
A análise dos pesquisadores de instituições renomadas reforça essa visão de um mercado de duas velocidades. O presente é de pressão, mas o futuro pode reservar um cenário diferente. A complexidade do momento exige cautela e análise aprofundada por parte do produtor.
Segundo pesquisadores do Cepea, apesar de a oferta ainda estar elevada no mercado à vista, o que vem causando pressão sobre os valores, a menor qualidade da cana e o redirecionamento crescente para etanol sinalizam restrição de oferta futura de açúcar.
Essa citação resume perfeitamente o dilema atual. A gestão dos estoques e a estratégia de venda se tornam ainda mais cruciais. Vender tudo agora para aproveitar o volume ou segurar parte da produção esperando uma possível alta futura? A resposta para essa pergunta depende do fôlego financeiro e da estratégia de cada um, mas a informação de qualidade é a base para tomar a melhor decisão.
Em resumo, o mercado de açúcar cristal atravessa um período delicado. A pressão gerada pela ampla oferta da safra que termina derrubou os preços em relação ao início do ciclo. No entanto, os fundamentos de produção, como a qualidade da cana e o forte direcionamento para o etanol, constroem um argumento sólido para uma oferta mais restrita à frente. O produtor que conseguir navegar pela turbulência atual, mantendo-se informado sobre os movimentos do mercado interno e externo, estará mais bem preparado para aproveitar as oportunidades que o próximo ciclo pode oferecer.
AGRONEWS








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